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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Confira o artigo 'Novos instrumentos de trabalho?

Medicações psiquiátricas, álcool e outras drogas são frequentemente utilizados como estratégia para lidar com o estresse nas mais diversas profissões exercidas pelos trabalhadores em todo o mundo. Não é diferente com os bancários. A alta demanda por resultados associada a um discurso institucional dissimulado, o qual seduz o trabalhador a doar-se além de suas obrigações à empresa, estão no âmago do adoecimento dessa categoria.


As condições de trabalho e o uso de substâncias psicoativas já possuíam intricada relação na época do surgimento do trabalho assalariado. É importante ressaltar que não estamos falando apenas sobre as drogas ilícitas, mas também diversas substâncias comercializadas legalmente (medicações psiquiátricas, álcool, tabaco, etc.). Um bom exemplo dessa problemática é o abuso de bebidas alcoólicas por trabalhadores que ocorria em diversas indústrias durante a Primeira Revolução Industrial sem que a empresa interviesse, uma vez que o consumo de tal substância aumentava a carga horária máxima de atividade tolerada pelos funcionários. Infelizmente, não são poucas as semelhanças deste triste exemplo com as atuais condições de trabalho dos bancários.



O discurso institucional promovido pelos bancos de que organização e bancários trabalham juntos, lado-a-lado, de maneira que uma relação de colaboração mútua se estabeleça, é amplamente disseminado. O “encantamento” dos trabalhadores, que compram esse discurso, é fundamental para a banalização do ritmo frenético e da carga de trabalho desumana aos quais são submetidos. Somado a isso, está a instabilidade do emprego, gerando a crença (nada menos do que verdadeira) de que qualquer deslize pode ocasionar sua demissão.



Sendo assim, os bancários trabalham além do que devem, são rotulados como incompetentes quando não atingem as metas (absurdas, por sinal), e aceitam exercer a profissão em condições insalubres (tanto física, quanto psicologicamente). Ou seja, os bancários “vestem a camisa” da empresa para que esta alcance seus objetivos, colocando em segundo plano as necessidades básicas para manutenção de sua qualidade de vida. A redução das atividades de lazer (produto direto da onipresença do trabalho na rotina dos trabalhadores, inclusive nos finais de semanas), por exemplo, diminui o repertório de estratégias que os bancários poderiam utilizar para lidar com esses estresses.



Logo, não é difícil entender como diversas substâncias surgem, nesse contexto, como formas de manter-se em um nível de competitividade adequado, contemplando as exigências feitas pelo banco e, por consequência, assegurando sua permanência no emprego. As drogas são elevadas à condição de “instrumentos de trabalho”, banalizadas, tidas como parte naturalmente integrante da atividade laboral. Trata-se da automedicação dos problemas advindos do exercício profissional, da anestesia do sofrimento.



Desde a medicação utilizada para dar o “pique” necessário para enfrentar o cotidiano corrido até o álcool ou a maconha para relaxar e esquecer os problemas, muitos são os casos relatados pelos bancários junto ao Departamento de Saúde do SindBancários. E, apesar dessas drogas serem utilizadas com o objetivo de agir sobre diversos sintomas indesejáveis, devemos lembrar que elas levam à dependência física e psicológica, além de causarem notável dano à saúde de seus usuários devido aos inúmeros efeitos adversos.


Assim como nas primeiras indústrias modernas, o uso de drogas ainda é banalizado no contexto de trabalho e o trabalhador continua sendo o maior prejudicado. No momento em que as consequências negativas do abuso de substâncias psicoativas começam a se manifestar no ambiente laboral, o trabalhador é responsabilizado individualmente por sua condição, é rotulado de “o problemático”, e os fatores adoecedores subjacentes a sua prática profissional são desconsiderados. Talvez a mudança mais evidente dessa lógica seja a ampliação da gama de drogas utilizadas. Enquanto antigamente o álcool era o problema mais relevante, atualmente, juntam-se a ele as medicações psiquiátricas de toda sorte, a maconha, a cocaína, entre outras.



Muitas vezes utilizadas como “válvula de escape” no contexto de trabalho, as drogas lícitas e ilícitas fazem parte das contingências perversas às quais os bancários estão submetidos, pois intermedeia a troca da qualidade de vida e saúde pela ilusão de um desempenho mais eficiente e competitivo no mercado de trabalho. Ou seja, não satisfeitos com a acumulação dos lucros, os Bancos se apropriam da saúde dos bancários, individualizando o seu adoecimento.



 
*Thiago Prusokowski
Luiziana Souto Schaefer

Departamento de Saúde do SindBancários de Porto Alegre

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