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domingo, 29 de janeiro de 2017

“A América Latina não precisa mais da espada de Bolívar; precisa de crédito" (Luiz Inácio Lula da Silva)

 
imagemCrédito: mercopress


*Paulo Schueler
Em recente viagem a Bogotá, durante evento organizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o ex-presidente Lula afirmou que “A América Latina não precisa mais da espada de Bolívar; precisa de crédito".

A frase, que já representaria uma afronta à manutenção da soberania de nossos povos em um momento de exacerbação da crise do capitalismo, crise energética mundial, que traz o cenário nem tão longínquo de disputa por fontes de água potável e agressão imperialista, torna-se ainda pior com o anúncio, quase simultâneo, de que Brasil e Colômbia assinaram acordo militar para “monitoramento” das fronteiras comuns – meses após Brasília ter assinado acordo de cooperação militar com Washington e com a demonização crescente das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e de sua forma de atuar na luta de classes colombiana.

A América Latina, continente no qual a mobilização popular de alguns povos levou às eleições de governos progressistas na Venezuela, Bolívia, Equador e Peru; território que detém o Aquífero Guarany e amplas reservas comprovadas de petróleo e minérios, local onde está localizada a maior floresta tropical do planeta e seu incalculável estoque de biodiversidade, precisa talvez como em poucos momentos de sua história ter em punhos a espada de Bolívar, assim como o legado de José Marti, para se defender da possibilidade crescente de intervenção externa em seus destinos – cujo maior exemplo, aliás, é a interferência de Washington sobre a vida dos trabalhadores da Colômbia.

Integração para o capital...
No evento organizado pelo BID, Lula afirmou que é o momento de nós latino-americanos “pensarmos em nós mesmos” para uma platéia de 500 empresários e altos funcionários da Colômbia e do Brasil.

Entre eles, o ministro das Comunicações do Brasil, os governadores de Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, e empresário Marcelo Odebrecht (Odebrecht) e José Sergio Gabrielli (Petrobras), além de Luis Carlos Sarmiento (Grupo Aval), Germain Efromovich (Avianca) e Carlos Raul Yepes (Bancolombia).

Falava não de nossos povos, mas das possibilidades de exploração do trabalho que deveriam ser abertas às burguesias dos dois países. Não à toa, deu o “caminho das pedras” aos empresários presentes: grandes investimentos devem ser feitos em barragens, usinas hidrelétricas, estradas, oleodutos, nos biocombustíveis e no setor automotivo. Segundo ele, nisso “repousa a integração”.

Ao defender “crédito”, Lula na verdade solicitou que os Estados nacionais do continente financiassem a manutenção e elevação do lucro de grupos empresariais ligados a estes setores, como o BNDES brasileiro já faz com empreiteiras e montadoras. Foi o ventríloco mercador de interesses privados, remunerado por isso a preço de ouro em suas recentes e já famosas “palestras” ao mundo empresarial.

A “integração” que deseja é a citada pelo banqueiro Luis Carlos Sarmiento, que deseja um Tratado de livre comércio entre os dois países e a possibilidade de o empresariado colombiano se associar à Bovespa, bolsa de valores brasileira, para “abrir caminho para o mercado de capitais”.

O pior é que tais negociatas já começaram: a Petrobras vai investir 430 milhões dólares na Colômbia, e em 2012 começará a perfuração de um poço no Caribe colombiano. A companhia brasileira objetiva ainda comprar uma participação na Ecopetrol colombiana. Na Colômbia, a Petrobras já tem uma produção de 40 mil barris diários de petróleo em 16 blocos.

Já Sarmiento iniciou visitas e contatos com os bancos brasileiros Bradesco e Itaú para “importação” de estratégias na gestão de tecnologia, além, é óbvio, da estratégia de ferrenha exploração do trabalho, como ocorre com os bancários brasileiros. Não apenas dos bancos privados. Presente ao evento em Bogotá, o vice-presidente de Negócios Internacionais do Banco do Brasil (BB), Allan Simões Toledo, afirmou que o BB instalará seu escritório de representação naquele país em 2012.
... e repressão aos lutadores

Poucos dias depois do convescote burguês, os governos do Brasil e da Colômbia assinaram em Tabatinga (Amazonas) acordo para realizar ações conjuntas e coordenadas na fronteira comum, com a criação da Comissão Binacional Fronteiriça (Combifron) e a adoção do Plano Binacional de Segurança Fronteiriça.

Trata-se de uma indisfarçada estratégia de apoio militar brasileiro à repressão da insurgência colombiana, em colaboração com o exército da Colômbia e sua chefia imediata – o imperialismo norte-americano.

Apesar do discurso no lado brasileiro da fronteira ser de controle da segurança nacional, o discurso do ministro da Defesa colombiano, Rodrigo Rivera, não deixa dúvidas: “Será compartilhada inteligência e experiência entre as forças dos dois países, e serão realizadas operações coordenadas entre os militares e os organismos de segurança contra as ameaças, cada um em seu território. O mundo deveria condenar as Farc pela depredação de nossas selvas para suas atividades criminosas”, declarou Rivera.

Palavras do lacaio sobre o uso do “agente laranja” pelos EUA? Obviamente que não.
*Paulo Schueler é membro do Comitê Central do PCB e editor do Imprensa Popular
21/08/2011.