PCB-RR

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

BREVE BALANÇO DE 2023 - BRASIL

*Gerardo Santiago

Em um ano de Lula 3 o que temos? Um teto de gastos públicos, agora denominado “arcabouço fiscal”, na verdade, um calabouço fiscal que impede que se repita o volume de investimentos públicos realizado pelo próprio Lula no período entre 2003 e 2010, por exemplo. Temos privatização de presídios, transformando o encarceramento em massa da juventude pobre e negra das favelas e o trabalho dela no cativeiro em fonte de lucro. Uma “reforma tributária” que se limita a simplificar um sistema injusto, deixando intacta toda a sua injustiça. Ampliação da obscena imunidade tributária das empresas religiosas. Reajuste zero para os servidores públicos em 2024. Operações GLO em portos e aeroportos, insistindo na desastrosa política de militarização da segurança pública. Forças Armadas, PF e MPF no mesmo regime de autogestão que tanto adubou a Lava Jato e o bolsonarismo. Militares dos Estados Unidos realizando “exercícios” na Amazônia com militares brasileiros. Uma política externa tímida e tíbia, incapaz de romper relações diplomáticas com o estado sionista, apesar de seus atrozes crimes contra a humanidade, incapaz, na verdade, de se descolar realmente do Império do Mal estadunidense. Um governo conservador de composição com a direita, as oligarquias nativas e o imperialismo. 

E o que não temos? Uma agenda política e econômica que seja nem digo anticapitalista, mas pelo menos antineoliberal, por parte do governo que diz se preocupar primeiro com os de baixo, as maiores vítimas do neoliberalismo no Brasil e no mundo. Não temos proposta de reverter privatizações ou restabelecer direitos sociais e trabalhistas eliminados ou diminuídos pelas contrarreformas trabalhistas e previdenciárias neoliberais dos governos Temer e Bolsonaro. Não temos a decisão de revogar o deletério “Novo Ensino Médio” que tenta fazer da escola pública fornecedora de mão de obra barata e obediente para ser super explorada pelo capital. Outros exemplos do que não temos poderiam ser citados, mas isso tornaria o texto muito extenso, assim ficamos com a lista exemplificativa acima.   

Só que o fato de Lula não ter uma agenda anticapitalista ou pelo menos antineoliberal não torna essas agendas menos importantes, por isso uma necessidade histórica e política mais do que urgente hoje é a construção de uma oposição de esquerda ao governo lulista no Brasil. Nos governos petistas anteriores, o PSOL cumpriu essa função, ainda que com muitas limitações. Hoje está reincorporado ao lulismo, apesar da brava resistência de alguns poucos. Diferente do PSOL, essa nova oposição de esquerda não pode repetir a aposta do petismo na política institucional e eleitoral como arena preferencial e até exclusiva da disputa política. Muito pelo contrário, ela deve denunciar a natureza de classe e o papel conservador dessa institucionalidade política e eleitoral, em momentos de eleição e fora deles. 

É um grave erro afirmar que é “democrático” um regime político em que o poder econômico interfere diretamente no processo político e é capaz de definir seus rumos em situações de “normalidade”, isto é, quando a política se mantém confinada nos espaços institucionais e eleitorais e não transborda para as ruas, o que geralmente ocorre em momentos de crise aguda. A verdade é que a “democracia” liberal capitalista atual é muito como a “democracia” ateniense de senhores de escravos da antiguidade grega, um sistema em que o poder político decorre diretamente do econômico, da propriedade. 

A “esquerda” que assume para si a defesa desse sistema a pretexto de “combater o fascismo”, ao fazer isso renuncia a qualquer perspectiva realmente transformadora e radical e se torna conservadora. E ainda facilita o trabalho de propaganda da extrema-direita de identificar “esquerda” com “sistema” e se apropriar de um charme “rebelde” e “subversivo” que tradicionalmente era da esquerda sem aspas. Quer dizer, acaba ajudando o fascismo que diz querer combater. 

A oposição de esquerda ao governo lulista tem que ser ideológica e programática, ser ferozmente antineoliberal no dia a dia e ter como horizonte estratégico o anticapitalismo e o anti-imperialismo, o socialismo. Ela não só não se confunde como se coloca como antípoda e inimiga da oposição de direita e extrema-direita ao lulismo, com a qual não se alia para nada em nenhuma circunstância. O seu inimigo é a classe dominante e sua ideologia, seja esta neoliberal, “libertária”, fascista ou “democrática”.

*Gerardo Santiago é Advogado, Aposentado do BB, Ex-Diretor do Seeb/Rio e Militante do PCB-RR.


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