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quarta-feira, 26 de maio de 2021

O tabuleiro incompleto

A intervenção da senadora Kátia Abreu (PP-TO) dirigida ao ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo na CPI da Covid dá uma boa noção do crescente isolamento das hostes governistas.

 

Ex-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e ex-ministra da Agricultura no segundo governo Dilma, a senadora representa parcela significativa da elite do agronegócio no país. Não a troco de nada o capitão reformado se antecipou e foi ao Mato Grosso do Sul andar a cavalo de chapéu e fazer demagogia entregando alguns títulos de terra. Já previa o que vinha pela frente.

 

A volta do ex-presidente Lula ao cenário político mudou a correlação de forças, as pesquisas de opinião demonstram isso claramente, indicando-o como favorito na corrida presidencial. Afinal, é inegável que a campanha eleitoral para o ano que vem já começou.

 

Com quase meio milhão de mortos e cerca de 16 milhões de infectados pela Covid, o Brasil enfrenta a pandemia de maneira descontrolada em nível nacional devido a absoluta ausência de políticas públicas calcadas na ciência. Reiteradamente o governo federal e seus parceiros em nível estadual e municipal se recusam a adotar medidas implantadas em diversos países com resultados positivos.

 

Juntam-se a esse quadro 14,5 milhões de desempregados que somados aos subocupados totalizam cerca de 32 milhões de trabalhadores, mais de 40% da População Economicamente Ativa (PEA). É um recorde histórico conseguido pelo atual governo: o povo passando fome e vivendo na miséria. E o que o governo faz: destina um auxilio emergencial de R$ 150,00 mensais. Ou seja, se o povo comprar gás ou pagar as contas de luz e água não compra comida. Se comprar comida não paga nenhuma das três contas. Até o Banco Mundial, escaldado em mascarar a realidade para proteger o capital, preconiza um total de R$ 440,00 mensais.

 

Em verdade, “116,8 milhões de brasileiros não tinham acesso pleno e permanente a alimentos. Desses, 43,4 milhões (20,5% da população) não contavam com alimentos em quantidade suficiente (insegurança alimentar moderada ou grave) e 19,1 milhões (9% da população) estavam passando fome (insegurança alimentar grave)”, segundo o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, em pesquisa realizada no final do ano passado.

 

A economia como um todo vai mal. É óbvia a queda no consumo e, portanto, na produção, a exacerbada concentração de renda se mantém inabalável, algumas grandes empresas deixaram o país, há o incremento de atividades ilegais, vide o meio ambiente e as milícias, além do isolamento internacional e problemas com o maior parceiro comercial do país, a China (vide a soja), e tantos outros fatores que tornam a atual conjuntura de extrema dificuldade para o atual governo e sua prioridade: a reeleição.

 

Diante desse quadro o sempre presidenciável coronel nordestino chamou para si a tarefa de oposição ao Lula e se aproximou da direita, com destaque para ACM Neto, todo poderoso do DEM. Procura desbancar o governador de São Paulo e ser o candidato da direita, isolando ainda mais o capitão reformado.

 

Essa mesma política econômica, entretanto, implica em substancial apoio ao governo, tanto pela retirada dos direitos dos trabalhadores e do povo, quanto pelas privatizações de setores estratégicos altamente lucrativos, as “meninas dos olhos” do grande capital.

 

A privatização da Eletrobrás é criminosa, não só pelo papel estratégico que ela representa, mas pelas condições arroladas, uma verdadeira doação, não só pela produção e distribuição de energia, mas pelo imenso volume de água doce envolvido. É um crime de lesa-pátria e de lesa-humanidade.

 

A própria mídia empresarial, em grande parte, deixa claro o quanto a agenda econômica coesiona a burguesia. Crítica do governo em suas ações diante da pandemia é uníssona em apoiar as medidas de interesse do grande capital.

 

Cabe destacar que a agenda econômica também favorece as Forças Armadas, as milícias e as seitas neopentecostais (aí com algumas divergências dentre a burguesia), além de alguns setores da pequena burguesia, bases da sustentação política do atual governo.

 

Ainda assim o desgaste do governo é evidente, não há indicador de que vá mudar, apesar de no Brasil atual nada mais ser considerado surpresa.

 

O tabuleiro político começa a se definir, as peças estão se movendo em busca de ampliar seus espaços e obter mais adeptos.

 

A única novidade é a candidatura do deputado federal Glauber Rocha (PSOL-RJ), parlamentar combativo e um dos melhores, quiçá o melhor parlamentar em nível nacional. A proposta visa coesionar a esquerda em um programa de verdadeiras mudanças, não somente de derrota do genocídio, apesar desta ser prioritária.

 

Infelizmente, a principal peça ainda está apartada do jogo, ocupa um pequeno espaço no canto do tabuleiro. Caberia e cabe às forças progressistas dedicarem todos seus esforços e ações para incrementar e fortalecer a ação dos trabalhadores e das massas populares, a fim de assumirem seu papel de protagonistas.

 

O Chile é um ótimo exemplo!

 

Afonso Costa

Jornalista



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