PCB-RR

domingo, 10 de setembro de 2023

O FASCISMO EM FORMA DE TANGO II


 *Gerardo Santiago.         O maniaco pode virar Presidente da Argentina.

Javier Milei será eleito presidente da Argentina? Provavelmente sim. Infelizmente a vitória eleitoral dele é o cenário mais provável, por conta de diversos fatores. Há semelhanças com o processo que levou Bolsonaro ao Planalto.    


Pelas normas eleitorais argentinas um candidato pode levar no primeiro turno com 45% dos votos válidos ou mesmo 40%, se tiver uma vantagem de dez pontos percentuais sobre o segundo colocado. Se essas regras valessem para o Brasil em 2018, Bolsonaro teria sido eleito no primeiro turno. Não dá para descartar que o "libertário" leve já em outubro. Se não levar, estará muito bem posicionado para vencer em novembro. 


Assim como aconteceu no Brasil há cinco anos, a direita tradicional, dita "conservadora" ou "liberal", está estendendo o tapete vermelho para a extrema direita. O ex-presidente Mauricio Macri vem fazendo sucessivos elogios públicos a Milei, apesar de sua coalizão partidária ter uma candidata, sua ex-ministra Patrícia Bullrich, que corre o risco de ver boa parte dos seus votos migrarem para o "louco", com as bênçãos de seu ex-chefe.   


Também de forma semelhante ao sucedido no Brasil, Milei é visto pela maioria como um candidato "contra tudo o que está aí". Ele vocifera contra a "casta política" e faz dela o símbolo do estado, que estaria sempre conspirando contra a "liberdade" do povo. A sua agressividade e o seu vocabulário de torcedor de futebol no estádio são parte de sua "autenticidade". As atrocidades que disse e diz também, são em parte normalizadas, em parte minimizadas. 


Se não conseguir esvaziar a candidatura concorrente no campo da direita o suficiente para levar no primeiro turno, o segundo ele deverá disputar com Sergio Massa, atual ministro da Fazenda do governo de Alberto Fernandez, que abriu mão de disputar a reeleição. Como Fernandez, Cristina Kirchner também ficou fora da disputa. Massa é da direita peronista e sua escolha como candidato indica que o peronismo vai fugir da raia do debate ideológico na campanha, como a própria Cristina disse, ele é "a direita para ganhar da direita". 


O governo de que Massa faz parte foi eleito contra a política de Macri e seu acordo com o FMI, mas durante quatro anos se limitou a administrar essa política e esse acordo. Quase metade da população está abaixo da linha de pobreza, a inflação é de 113% nos últimos doze meses. Num confronto com Milei, ele será o defensor de um status quo contra o qual existe um enorme descontentamento.              


O que a tragédia que se está desenhando na Argentina nos mostra, entre outras coisas, são os limites do progressismo latinoamericano. Tendo feito a opção pela via exclusivamente eleitoral como forma de disputa do poder, para ganhar eleições ele foi cada vez mais moderando o seu programa e assumindo compromissos com a classe dominante. Nesse processo, passa a ser um dos partidos da ordem, a fazer parte do cardápio de opções políticas da burguesia, que recorre a ele quando há necessidade de canalizar institucionalmente a revolta e o descontentamento populares e o descarta quando há condições de aprofundar a exploração e a extração de mais valia com políticas mais agressivas, como as de Milei e Bolsonaro. 


Assim, o progressismo serve como "Plano B" da classe dominante quando as suas alternativas preferenciais estão politicamente desgastadas, como Macri em 2019. Depois de um período se desgastando por sua vez no governo, administrando um "sistema" com o qual ele não tem nem a vontade e nem a capacidade de romper, o progressismo se esvazia eleitoralmente e cede a vez a alguma alternativa ainda mais à direita que aquela que ele foi chamado a substituir. Nesse ponto, diante da direitização "da sociedade" o progressismo reage dando um ou mais passos rumo a um "centro" político imaginário, o que faz com que os eixos do debate político se desloquem ideologicamente cada vez mais para a direita. 


Esse ciclo vicioso só será rompido quando uma forte onda de revoltas  e levantes populares coloque novamente no proscênio uma esquerda anticapitalista, capaz de deixar para trás os limites do progressismo e recolocar a proposta socialista, comunista, no centro do debate político. Essa é a necessidade histórica da classe trabalhadora.

*Gerardo Santiago é Advogado, Aposentado do BB, Ex-Diretor do Seeb/Rio e Militante do PCB-RR.

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