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terça-feira, 11 de abril de 2023

Privatização é apropriação privada do que é público.

*Gerardo Santiago

A recente pesquisa Datafolha sobre privatizações nos mostra várias coisas relevantes e dignas de nota. A que ficou mais escancarada foi a desonestidade da cobertura jornalística da mídia corporativa, cujo emblema foi a manchete da Folha de São Paulo: "apoio à privatização dá salto e chega a 38%". Para saber que 45% são contra, é preciso ler a matéria. O Globo, jornalão da família Marinho, foi na mesma linha, de destacar o que o pensamento único neoliberal considera positivo e noticiar muito discretamente o que ele não considera. 

Infelizmente, eles tem mesmo algo a comemorar. Entre 2017 e hoje o apoio às privatizações quase dobrou, de 20% aos 38% celebrados nas manchetes da imprensa "livre" a serviço do capital privado. Em boa parte isso pode ser atribuído à propaganda liberal ministrada em doses massivas por essa mesma mídia, mas é fato também que o trabalho dela é facilitado pelo recuo ideológico de uma esquerda que desistiu de qualquer perspectiva anticapitalista e adotou os valores e a lógica do sistema que antes ela combatia. Esse recuo não foi apenas no tema das privatizações, ele abrange toda a política econômica e também a visão sobre o sistema político e de governo, áreas em que a ex-esquerda claramente caminhou ao encontro do liberalismo nas últimas décadas.       

Um número significativo na pesquisa é que 28% dos eleitores que se identificam com o PT sejam favoráveis às privatizações. Outro é que entre os mais pobres, com renda até dois salários mínimos, quer dizer, potencialmente os mais prejudicados com a privatização de serviços públicos, o apoio seja de 34%. Outro ainda é que entre os mais jovens (faixa de 16 a 34 anos) seja majoritária a ideia de que os produtos ou serviços fornecidos por empresas privadas sejam de melhor qualidade que os fornecidos por empresas públicas ou estatais.  

O que está faltando é batalha ideológica. É mostrar que privatização é apropriação privada do que é público. Que é uma ação entre amigos, como foram as privatizações da telefonia e da Vale durante o governo FHC, entre outras. Que a longo prazo o produto ou serviço encarece em termos reais. Que causa desemprego e enfraquece a capacidade do estado agir sobre a economia. Que é mentira que a gestão privada seja mais honesta e eficiente que a pública e estatal, vide casos como o da Americanas S/A e dos bancos que precisam ser "resgatados" com dinheiro público, todos eles privados. 

Os liberais sempre disseram que privatizar, desregulamentar, eliminar direitos sociais e trabalhistas e reduzir impostos para os mais ricos é a receita da prosperidade geral, pois haveria mais investimentos e uma vida melhor para todos. Há quarenta anos a receita deles é seguida na maior parte do planeta e o resultado está aí para quem quiser ver: o mundo é mais desigual hoje que na época da Revolução Francesa. 

Precisamos de uma esquerda que diga com clareza que o capitalismo liberal e sua "democracia" idem são uma fraude, que aponte o dedo para cada uma das promessas não cumpridas pelo liberalismo hegemônico há décadas e principalmente, que saiba mostrar aos mais pobres que seus interesses são diametralmente opostos aos da classe dominante, que se o transporte público for privatizado, por exemplo, vai ser muito bom para os donos das empresas que o explorarem, mas que Dona Maria vai pagar mais caro que pagaria ele sendo público. E que ademais, coisas como educação, saúde, transporte e saneamento, entre outras, são direitos de todos, fazer delas produtos de mercado prejudica a imensa maioria.

*Gerardo Santiago: Aposentado do BB, Advogado e Militante do PCB.

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