PCB-RR

domingo, 29 de julho de 2012

“Que se jodam!”


Não tem pão? Comam brioches!
A primeira frase é da deputada Andrea Fará, do PP, partido continuista do nefasto franquismo, quando da votação no congresso espanhol do pacote que cortou 65 bilhões de euros em gastos governamentais. A segunda frase é mais famosa, da rainha Maria Antonieta, na França pré-revolucionária no século XVIII, que acabou decapitada. As duas expressam o desdém da elite para com os povos de ontem e de hoje.


A troika composta pelo Banco Central Europeu, FMI e União Européia através do Eurogrupo – reunião de 17 ministros da Fazenda da zona do Euro - impôs um pacote a Espanha com corte de 65 bilhões de euros em gastos governamentais. Tudo isso para receber um empréstimo de 35 bilhões de euros, a grande maioria destinada a salvar os bancos. Grande negócio!


Por isso o povo espanhol tem ido às ruas em manifestações cada vez maiores, reunindo centenas de milhares de pessoas. Uma cena curiosa nesses atos foi um cartaz com a frase “Que se jodam, pero mira cómo roban” em clara alusão a frase da deputada. Sorte dela que na Espanha não tem guilhotina.



Outra expressão utilizada e que sintetiza o sentimento de revolta do povo espanhol é bem clara: “Menos para os políticos e os banqueiros, mais para os povos”. Uma referência ao fato do governo conservador de Mariano Rajoy, um espécie de FHC de lá, ter entregue os rumos da economia a Bruxelas – o comando da zona do euro – e do fato de existirem 400 mil políticos no país, todos muito bem com a vida, obrigado.



A contrapartida a esse “empréstimo” são perdas salariais aos funcionários públicos, a elevação de impostos, a restrição e diminuição do auxílio-desemprego, o aumento do desemprego, que já ultrapassa 25% da População Economicamente Ativa (PEA) e atinge sobretudo os jovens, dos quais cerca de 50% estão sem trabalho.



A Espanha é a quarta maior economia da União Européia e por isso somente este ano mais de 200 bilhões de euros saíram do país. O capital viu a crise chegar, crescer e fugiu para praças com maior rentabilidade e segurança.



A crise econômica hoje atinge duramente Grécia, Espanha, Portugal, França e Itália. Iniciada nos Estados Unidos em 2008 com o colapso do sistema imobiliário, a débâcle rapidamente sumiu das grandes empresas, principalmente nos EUA: os lucros das suas corporações é o maior desde a década de 50, se comparado com o Produto Interno Bruto. Tudo isso graças às medidas preconizadas pelos banqueiros, os grandes responsáveis por tudo que está acontecendo. Que o digam os dirigentes do Goldman Sachs, banco estadunidense que conseguiu plantar vários dos seus homens de confiança em postos chaves em governos europeus. Não por coincidência a grande maioria em crise. E ainda há uma pseudo jornalista econômica que utilizava e utiliza as análises desse banco para seus comentários. Ignorância ou maldade?


A dívida dos países ricos alcançou no ano passado US$ 42 trilhões, correspondentes a 61% do Produto Interno Bruto global em valores de 2011. Em 2007, antes da crise, a dívida dos países ricos era de US$ 26 trilhões e correspondia a 47% do PIB global. Acredita-se, entretanto, que o capital especulativo em todo o mundo gire em torno de algumas centenas de trilhões de dólares – há quem fale em até 600 trilhões. É muita especulação para pouca produção, mais hora menos hora a falta de lastro iria se fazer sentir, como o está fazendo desde 2008.



Chegaram os ventos europeus

Aqui as coisas também não andam boas. As exportações caíram, o número de trabalhadores com carteira assinada teve um decréscimo de 25% no primeiro semestre, a indústria tem seu pior desempenho em muitos anos, as grandes empresas estão com dificuldades para pagar suas dívidas junto aos bancos, a arrecadação do governo federal caiu em junho como há muito não se via, a previsão de crescimento do PIB para este ano reduziu para 2%, e pode diminuir ainda mais.



O governo tem adotado medidas para enfrentar a situação, mas elas não têm surtido o efeito desejado. Os juros estão em 8% - a menor taxa de muitos anos – foram feitas várias isenções fiscais para a indústria a título de incentivo para a produção e o consumo, recentemente foi encaminhado um pacote que libera R$ 20 bilhões para a iniciativa privada, o dólar está em um patamar elevado para estimular as exportações, entre outras ações. Todas elas infrutíferas.


O que segura e prende nosso crescimento e uma maior distribuição de renda tem a mesma origem da crise europeia: o alto pagamento feito aos rentistas. Este ano 47% do Orçamento da União é para pagamento e amortização das dívidas externa e interna. É mais de um trilhão de reais, que deveriam estar sendo investidos no desenvolvimento, mas estão apenas engordando as já obesas contas dos banqueiros.


Nas páginas deste MM previ, em 2004, a crise econômica que atinge grande parte do centro da economia capitalista. Agora, infelizmente, sou obrigado a reafirmar que não há luz no fim do túnel. Se não houver um redirecionamento dessa política, e nada indica que haverá, o Brasil pode entrar em uma séria crise de proporções inimagináveis, ao nível da presente na Europa. Será que vamos ter que ver para crer?



Afonso Costa é Jornalista e escreve para o Monitor Mercantil
8353-3713











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