A Doença Senil do Reformismo
Nos
últimos meses observamos um fenômeno inusitado. Trata-se de uma amnésia
seletiva que vem contaminando setores da chamada “esquerda”. Diferentemente da
“justiça seletiva”, que é uma prática da institucionalidade burguesa para
alijar adversários políticos e jogá-los na cadeia sem culpa formada, conforme
sucedido com o ex-presidente Lula, essa amnésia seletiva constitui-se numa
operação de propaganda, visando encobrir, na história recente, tudo aquilo que exponha contradições de determinada vertente político-ideológica.
Repressão contra a greve dos profissionais do ensino, setembro 2013, RJ. |
Outra lembrança que não deveria ser apagada refere-se à política
agrária. Nos tempos em que estava na oposição, o PT fazia a defesa da Reforma
Agrária, dos trabalhadores sem-terra, dos pequenos produtores rurais e de uma
agricultura sustentável, voltada principalmente para garantir o consumo
interno. Depois que assumiu o governo a coisa mudou. Lula e Dilma se notabilizaram
por uma aliança explícita com o agronegócio, coroada pela entrega, no segundo
mandato da Dilma, do ministério da agricultura para ex-presidente da
Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a pecuarista e senadora
Kátia Abreu, desde sempre uma ferrenha inimiga do MST. O setor foi abastecido por crédito
farto e subsidiado, além de favorecido por medidas provisórias (422 e 458), que
ficaram conhecidas como as “MPs da grilagem”, deixando mais de sessenta milhões
de hectares de terras públicas na Amazônia a disposição dos grileiros. Enquanto
os grandes proprietários de terra eram agraciados com essas medidas, os
assentamentos de famílias de trabalhadores sem-terra não tiveram avanço
significativo, diminuindo sensivelmente durante o governo Dilma, até mesmo
quando comparados com o período de FHC.
Manifestantes cercados em Belo Horizonte, Copa do Mundo 2014. |
Outras lacunas na memória dos acometidos por essa amnésia estão
relacionadas aos ataques às liberdades democráticas. Não falam da repressão aos movimentos
grevistas, dos assassinatos de lideranças rurais e da violência das operações
policiais nas áreas mais pobres das grandes cidades. Silenciam sobre a Lei Antiterrorismo,
a aplicação do decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e o gigantesco
aparato repressivo usado contra as manifestações populares na Copa
do Mundo 2014 e no Jogos Olímpicos 2016. Mesmo fatos mais recentes, ocorridos
após o golpe parlamentar que afastou Dilma, não são lembrados, como o voto favorável do PT e dos
seus aliados à cláusula de barreira e à proibição das coligações proporcionais,
essa última aprovada também pelo PSOL.
O reformismo senil esperou, provavelmente
sentado, por uma “autocrítica” do PT, como ela não veio e novas eleições se
aproximam, essa amnésia seletiva parece que vem bem a calhar.
Ney Nunes
Outubro de 2019
Fonte:https://pagina1917.blogspot.com/2019/10/amnesia-seletiva.html
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