*Afonso Costa
O trágico assassinato de um rapaz de 17 anos regurgitou o clamor anacrônico da mídia pela redução da idade penal.
É
a mesma mídia que defende a intervenção do imperialismo na Síria, a
tentativa de golpe na Venezuela, os assassinatos na África, o desemprego
e as mortes na Europa, a ocupação da palestina, a falsa democracia nos
Estados Unidos, em suma a imposição do coturno neonazista no planeta
É essa mídia que aplaude os leilões Agência
Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, que envolve
algo em torno de em 30 bilhões de barris de petróleo, o equivalente a
três trilhões de dólares. No entanto, a Agência espera arrecadar com o
leilão apenas um bilhão de dólares. Qual o tamanho do prejuízo para o
país?
Essa
mídia despreza o fato de que no Brasil cerca de 35% dos jovens vivem na
pobreza, dos quais metade beira a extrema pobreza; que o índice de
desemprego atinge mais de 15% na faixa etária entre 15 e 24 anos.
Destes, mais de dois milhões e meio não estudam, não trabalham, não têm
sequer acesso aos programas sociais do governo, como bolsa família e
outros. São órfãos do Estado.
Nas
famílias que possuem crianças de até 14 anos em suas residências -
cerca de 40% do total do país - pouco mais da metade têm todos os
serviços de saneamento necessários, entendidos como banheiros nas casas,
acesso à rede de esgoto, água potável e coleta de lixo. Como pretender
imputar a esses jovens quaisquer responsabilidades, se o Estado se faz
ausente em suas vidas?
A
defesa da redução da idade penal apenas pretende engrossar o
encarceramento da juventude, que hoje representa 80% dos mais de meio
milhão de detentos em nível nacional.
Essa
dura realidade não vem sozinha. Se reflete diretamente na educação, ou
melhor dizendo na literal falta de educação da juventude brasileira.
Aproximadamente 18 milhões de jovens sequer possuem o Ensino Médio
completo, o que acarreta problemas de sobrevivência, com decisiva
influência na qualificação profissional e na própria violência.
É
essa mesma mídia que apóia a internação forçada dos “cracudos”, os
consumidores de crack, zumbis largados na periferia dos grandes centros
urbanos. Onde está a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos
Deputados para defender o direito de liberdade dos jovens vítimas dos
traficantes? Qual a sua atuação no debate em voga no Congresso sobre a
nova lei de criminalização e punição aos consumidores de drogas?
Penaliza-se as vítimas, faz-se vista grossa para os verdadeiros
criminosos, não apenas os traficantes, mas os que mais lucram com a
infelicidade alheia.
É
essa mesma mídia que aplaude a ostentação de riqueza do filho de um
ministro da ditadura militar empresarial, provável beneficiário da
privatização do Maracanã.
É
uma mídia dirigida contra os povos brasileiro, europeu, africano,
palestino, estadunidense, sul americano. É uma mídia dirigida, os drones
das palavras escritas e faladas a atingir os povos de todo o mundo. É a
mídia que lamenta – como todos nós – as mortes na maratona de Boston,
mas esquece que milhões de cidadãos no mundo buscam vingança contra
todos os males que os EUA praticam de norte a sul, de leste a oeste.
É
uma mídia dirigida pelas multinacionais e corporações financeiras,
beneficiadas por governos subservientes e paraísos fiscais espalhados na
Europa, Ásia e América Central. Apenas nas ilhas Cayman as estimativas
apontam mais de 14 trilhões de dólares depositados, valor superior ao
PIB dos EUA e do Japão juntos. Disso essa mídia não fala.
Por
que não há o mesmo clamor dessa mídia por justiça, pelo fim da barbárie
e pela democratização da informação? Por que não interessa aos seus
patrões, aliados do grande capital, o verdadeiro responsável pelas
mazelas que assolam a humanidade.
Anualmente
morrem cerca de 50 mil pessoas no país, dos quais 40 mil são homens.
Desse total aproximadamente 19.000 rapazes de 15 a 24 anos, a imensa
maioria assassinada. São 60 jovens que falecem por homicídio a cada dia.
Por eles não há clamor. São rapazes abandonados, largados, desprezados
por um status quo ao qual interessa apenas os lucros e a maximização da
miséria em benefício próprio.
A
idade penal requer um debate político, econômico, social e até mesmo
ideológico, não meramente criminal como pretende a mídia subserviente ao
capital.
Afonso Costa
Jornalista
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